Essa frase não é minha. Quer dizer, é sim.
Na verdade, ela nasceu inspirada pelo tema central do WISE: o maior evento mundial em inovação na educação, no qual participei representando a Escola de Criatividade em 2017 e 2019. Unlearn, Relearn What it means to be human? Desaprender e reaprender, o que significa ser humano? Três mil pessoas entre gestores educacionais, educadores, estudantes, pensadores, empresários e líderes de vários cantos do planeta, reunidos durante quatro dias para discutir e debater a educação. Essa imersão me deixou com profundas reflexões sobre o valor da aprendizagem.
Um evento desse porte trazer à luz o debate sobre a habilidade humana de aprender, não foi por acaso. Estudos recentes revelados durante o Summit, mostraram: vivemos uma crise de aprendizagem onde os métodos e sistemas educacionais não têm sido suficientes para proporcionar o aprendizado aos mais diferentes perfis de alunos nas escolas pelo mundo. Vivemos em um mundo diverso, multicultural, com diferenças econômicas, religiosas, políticas e sociais, mas onde basicamente os mesmos métodos e sistemas educacionais tem sido a base de escolas ao redor do planeta. Não quero entrar na discussão dessa ou daquela pedagogia, desse ou daquele método. Esse não é o ponto. O ponto é uma simples pergunta que permeou as plenárias e as rodas de conversa do WISE: Por que tantas crianças e jovens pelo mundo não aprendem efetivamente?
Em uma fala contundente, Dr Jaime Saavedra Chanduvi – diretor do Banco Mundial que lidera um projeto global em educação para melhoria da aprendizagem, afirmou que estamos vivendo um momento além da crise de aprendizagem, estamos vivendo, segundo ele, uma pobreza na aprendizagem escolar. Utilizando dados em parceria com o Instituto de Estatísticas da Unesco, revelou que quase 53% dos estudantes em todo mundo não atingem proficiência mínima de leitura e compreensão de textos quando atingem 10 anos de idade. E essa porcentagem se eleva para 80% se tratando de países pobres. Mesmo com altos índices de crianças na escola, pelo mundo, metade das crianças até os 10 anos não leem adequadamente e não entendem pequenas histórias e textos. Dados graves que ameaçam seriamente os esforços de países em alcançar os objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS) estipulados pelas Nações Unidas (ONU). Sem os fundamentos de um bom aprendizado e consequentemente baixa evolução do capital humano no planeta, os objetivos do milênio estão em xeque. Se crianças não sabem ler, não serão autores da própria história, e pior, estarão a mercê de outras histórias ou de serem facilmente manipulados.
Diante disso, trago algumas reflexões pessoais a respeito: Precisamos – TODOS – nos colocarmos em posição de servir a aprendizagem, e não necessariamente ao ensino. Garantir que crianças e jovens aprendam efetivamente, respeitando ritmos, formas e estilo de cada um deles, deveria ser a maior obsessão de escolas e professores, e não a obsessão por métodos, sistemas, notas, disciplinas ou padrões para cumprir indicadores e metas educacionais. Para que sejamos melhores professores, precisamos primeiro, sermos melhores aprendizes, pois, dessa forma, nos colocamos fora do palco e aprendemos junto com os estudantes e para eles. Entendemos as necessidades de aprendizagem quase como uma necessidade de atenção e carinho, que certamente cada aluno deseja de seu mestre. Seres humanos nascem pensantes e criativos, porém, crescem enrijecidos por formas e regras que pouco dão valor a outra capacidade humana única – a de aprender, desaprender e reaprender. Somos seres pensantes, criativos e aprendizes na essência. Mas, deixamos de aprender quando não vemos sentido nas formas e estratégias, ou quanto o ensino por si só nos arranca a curiosidade e a magia de querer saber mais.
Vejo que a solução para a crise e pobreza de aprendizagem que afeta o nosso país, também está em todos assumirem sua responsabilidade pela melhoria da educação, que vai muito além de governos. Professores. Gestores. Pedagogos. Pais. Profissionais de todas as áreas, empresas, e a sociedade como um todo – são parte do problema e devem fazer parte da solução. Educação não se restringe à escola, claro. Mas também não se restringe a métodos e sistemas e sim na atitude e humildade de mudar.
No Brasil, ainda valorizamos demais o ensino pragmático e pouco a aprendizagem verdadeira. Ainda ouço gestores de escola e até pais dizerem que aquelas crianças não aprendem apenas porque não se dedicam ou não prestam atenção às aulas. Mas será que o problema é mesmo apenas do aluno? Ou como diria José Pacheco, será que não é um problema de ensinagem e não apenas de aprendizagem do aluno? É preciso investir mais em escolas e professores, é claro. Mas, também se faz necessária uma reflexão profunda sobre a carreira de um educador e seu impacto na vida de uma criança. Para que ele entenda o poder que ele possui como professor e também esteja aberto a mudar, a encontrar talentos e a manter o desejo maravilhoso e aprender que cada criança o possui na essência.
É preciso, acima de tudo, sermos capazes de nos colocarmos diante do desafio de aprender a desaprender, quebrando velhas convicções e formas, reaprender com a humildade de olhar o mundo ao nosso redor. E ter a lucidez de perceber para quê, quem e porque estamos ensinando e aprendendo?
Sem ensino, ainda sim podemos até dizer que há educação. Porém, sem aprendizagem, não há educação.
Sejamos aprendizes sempre, por toda vida.