Qual o sentido de ir para escola?
O que significa estudar, aprender?
Você aceitaria uma escola que não examina alunos por notas?
E se lição de casa fosse completamente abolida?
Como se sentiria se soubesse que seu filho(a) está infeliz ou doente e que a causa principal é a escola?
Há alguns anos conheci o trabalho de Vicky Abeles, uma produtora, autora e cineasta americana que produziu dois documentários sobre educação e que deveriam fazer parte da lista de filmes de pedagogos, professores e pais em todo o mundo. Vicky, uma “advogada” pelas causas da educação e juventude, é daquelas vozes necessárias para questionar e provocar mudanças.
Preocupada com seus filhos e por estudos que realizou, lançou em 2009 seu primeiro filme RACE TO NOWHERE – (Corrida para lugar nenhum). O documentário é um retrato forte da cultura da pressão e obsessão por resultados e conteúdos que fazem parte da educação norte americana, e sem dúvida de boa parte do planeta. Premiado e visto por mais de 7000 escolas pelo mundo, o filme ainda retrata a realidade nos dias de hoje no ambiente escolar, talvez agora ainda mais preocupante em tempos de pandêmicos e excesso de (des) informação e estímulos.
Crianças e adolescentes relatam de forma impactante no documentário como se sentem pressionados a produzir, performar, entregar intermináveis lições de casa, e estão por consequência “overstressed e underprepared” como comentou Denise Pope. Especialista senior em educação, currículo e engajamento jovem pela Universidade de Stanford e autora do livro Overloaded and Underprepared (Sobrecarregados e despreparados) Denise cita que “Estudantes chegam despreparados na Universidade pois passam o tempo da escola estudando para passar por provas e exames e não para aprender”. E complete que alguns são apenas excelentes passadores de exames, enquanto outros não veem sentido algum na escola e só cumprem tabela”.
O filme mostra como gerações inteiras podem estar comprometidas se não fizermos nada para mudar e humanizar esse sistema educacional vigente. Chegamos a um nível de obsessão por performance e conteúdo tão alto em diversos países, inclusive o Brasil, que essa geração e as mais novas serão as mais estressadas e desconectadas do propósito do significado de aprendizagem verdadeiro, do que qualquer outra.
Em comoventes relatos de adolescentes e crianças, pais e educadores são expostos a realidades que desconheciam ou não queriam ver. Seus filhos com sérias questões emocionais e doenças psicosomáticas que acometem mais comumente adultos estressados do mundo corporativo, e que agora chegam às crianças e jovens de 10 a 17 anos. Os casos de suicídio jovem também aumentaram significativamente. E estudos comprovam que tragédias com adolescentes e crianças poderiam ser evitadas se o ambiente escolar fosse mais acolhedor e focasse mais no prazer da aprendizagem e nos talentos, do que na pressão e competividade, em parceria com pais e a comunidade.
Um dos pontos mais destacados no filme como causadores desses níveis de estresse, além do conteudismo exagerado e examinação em massa, é a tão “aclamada” lição de casa. Sarah Benett, autora do livro HOMEWORK – Como a lição de casa está afetando nossas crianças e o que deveríamos fazer a respeito – comenta que o tempo que os filhos gastam fazendo o dever de casa disparou nos últimos anos. Pais passam horas intermináveis convencendo os filhos a cumprirem essas tarefas, e a verdade, de acordo com ela é que quase não há evidências de que o dever de casa ajude os alunos a fixar conteúdos ou a obter sucesso acadêmico.
E esse fardo que afeta as famílias, está comprometendo seriamente o crescimento saudável das crianças e jovens. Privação do sono, das brincadeiras, do exercício físico e do tempo livre de que necessitam para o desenvolvimento físico, emocional e neurológico adequado são problemas que precisam ser enfrentados. E segundo Sarah, é uma causa oculta da epidemia de obesidade infantil, que certamente tem aumentando em tempo de ambiente online, games e rede social.
Educação é uma causa a ser abraçada por todos. Governos, pais, famílias, comunidades, empresários, sociedade civil. Não somente a escola, sem dúvida. Entretanto a escola é parte nevrálgica e crucial para esse entendimento. Educadores, pedagogos, professores, precisam ter coragem para ir além.
Além do sistema, das convenções e metas, e precisam abraçar mudanças que valorizem o ser humano de forma integral. Educação integral está acima de carga horária, de notas, de conteúdo. Educar integralmente diz respeito ao ser humano de forma integral. Suas necessidades, seus anseios, dificuldades, talentos, paixões e sonhos. Não podemos tratá-los como recursos, números e metas. São os sonhos deles que estão no caminho que os levarão para algum lugar.